quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

TJ/RS - Acórdão Des. Nereu Giacomolli (prisão preventiva e nemo tenetur se detegere)


Caros,
segue decisão do Des. Nereu José Giacomolli (6a. Câmara Criminal do TJ/RS), ensejando efetivadade do nemo tenetur se detegere. Notem a (falta de) fundamentação quando da decretação da prisão preventiva pelo r. Juízo de 1o. Grau. Vejam se isso é justificativa...
Boa leitura!

Prof. Matzenbacher



HÁBEAS CORPUS. ESTELIONATO. DESNECESSIDADE DA

PRISÃO.

1. A prisão preventiva do paciente foi decretada devido ao seu não-comparecimento à audiência de instrução, impossibilitando o reconhecimento pessoal. O paciente justificou a ausência. A simples designação de nova data soluciona a questão.

2. No caso em apreço, trata-se de delito supostamente cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa e, mesmo em caso de eventual condenação, a pena privativa de liberdade seria substituída por restritiva de direitos.

3. A decretação da prisão resta injustificada, pois diante do princípio do nemo tenetur se detegere, ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo. Assim, o paciente poderia escusar-se de participar da diligência (reconhecimento pessoal), até mesmo pelo fato de o direito constitucional de silêncio ser um de seus desdobramentos.

LIMINAR CONFIRMADA.

ORDEM CONCEDIDA.

Habeas Corpus

Sexta Câmara Criminal

Nº 70022339659

Comarca de Novo Hamburgo

PAULO RENATO DA CONCEICAO NUNES

IMPETRANTE

CLAUDIO DANTE CABERLON

PACIENTE

JUIZ DE DIREITO DA 3 V CRIM DA COM DE NOVO HAMBURGO

COATOR

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Sexta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em confirmar a liminar e em conceder a ordem definitivamente, a fim de reconhecer ao paciente o direito de responder ao processo em liberdade, recolhendo-se os mandados de prisão.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Aymoré Roque Pottes de Mello (Presidente) e Des. João Batista Marques Tovo.

Porto Alegre, 06 de dezembro de 2007.

DES. NEREU JOSÉ GIACOMOLLI,

Relator.

RELATÓRIO

Des. Nereu José Giacomolli (RELATOR)

Trata-se de hábeas corpus impetrado por PAULO RENATO DA CONCEIÇÃO NUNES, em favor de CLAUDIO DANTE CABERLON, apontando como autoridade coatora o Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal da Comarca de Novo Hamburgo.

Relatou que o réu encontra-se com mandado de prisão preventiva decretada desde 14/11/2007, tendo em vista a decretação de revelia, por não comparecimento na audiência de instrução. Disse ter sido acusado da prática de estelionato, cometido, em tese, quando sócio da empresa Cedece Veículos Ltda, em processo falimentar. Sustentou não haver prova acerca do delito, embora a discussão probatória na via do hábeas corpus fosse restrita. Alegou não ter comparecido à audiência por ter tido um mal súbito. Referiu ter o paciente condições pessoais favoráveis à concessão da ordem, tais como atividade no ramo de veículos há mais de 20 anos, residência fixa e bons antecedentes. A falência de sua empresa foi decretada no ano 2004 e, neste período, não conseguiu adimplir suas obrigações. Aduziu a desnecessidade da prisão preventiva fundada na necessidade de efetuar o reconhecimento pessoal. Ademais, o paciente poderá ser beneficiado em caso de eventual condenação, com a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou com SURSIS. Invocou o princípio da presunção de inocência, ressaltando que a liberdade era a regra e a prisão é a exceção. Argumentou que a simples reprodução das expressões ou termos legais, divorciadas dos fatos concretos ou em meras suposições. Postulou a concessão a concessão liminar da ordem e que ao final fosse considerada definitiva. Juntou documentos (fls. 27 a 137).

Deferi a liminar (fls. 139 a 140).

Foram aprestadas as informações pela autoridade coatora (fls. 142 e 149).

Neste grau, o parecer do representante do Ministério Público foi pela concessão da ordem (fls. 144 a 148).

É o relatório.


VOTOS

Des. Nereu José Giacomolli (RELATOR)

Eminentes colegas:

A alegação do impetrante diz respeito, essencialmente, à desnecessidade da prisão, principalmente pelo fato de ter justificado o não-comparecimento à audiência de instrução.

Deferi a liminar nos seguintes termos:

O paciente juntou declaração do Centro de Habilitação de Condutores “Caberlon” no sentido de exercer função de Supervisor de Frota desde 19 de julho de 2007 (fl. 28). Comprovou residência (fl. 30), bem com o juntou atestado médico, a fim de justificar o não-comparecimento (fl. 134).

A prisão preventiva foi decretada para a conveniência da instrução criminal, nos seguintes termos:

“Aplico ao réu a pena de revelia. Como já possui um outro processo por estelionato, deixando de comparecer na audiência, onde seria feito o reconhecimento, decreto a prisão preventiva do acusado por conveniência da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei penal. Expeça-se mandado de prisão”. (fl. 108)

Ocorre que o paciente possui trabalho e emprego, havendo indicativos de ausência justificada na audiência.

O aprazamento de nova data suprirá a deficiência.

Por isso, defiro a liminar pleiteada.

Venham informações.

Mantenho o deferimento da liminar, acrescentando que a prisão preventiva é uma medida extrema, reservada aos casos essencialmente graves.

No caso em apreço, trata-se de delito supostamente cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa e, em caso de eventual condenação, com possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ao final. Na pior das hipóteses, em não sendo possível a substituição, em regime de cumprimento mais brando que o fechado.

Especificamente sobre o fundamento da prisão, isto é, a necessidade de reconhecimento, FERRAJOLI sustenta que a prisão cautelar poderia ser perfeitamente substituída por uma mera “detenção”, consistente em colocar o réu à disposição da justiça para a produção de provas, interrogatório, etc., pelo tempo estritamente necessário, ou seja, horas ou poucos dias (FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón, p. 776 e ss). Trata-se de medida menos gravosa.

Contudo, diante do princípio do nemo tenetur se detegere, isto é, que ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo, o paciente poderia escusar-se de participar da diligência (reconhecimento pessoal), até mesmo pelo fato de o direito constitucional de silêncio ser um de seus desdobramentos.

Assim, a prisão cautelar, nos termos em que proposta, não resta justificada.

Isso posto, voto pela confirmação da liminar e pela concessão da ordem definitivamente, a fim de reconhecer ao paciente o direito de responder ao processo em liberdade, recolhendo-se os mandados de prisão.

Des. João Batista Marques Tovo - De acordo.

Des. Aymoré Roque Pottes de Mello (PRESIDENTE) - De acordo.


DES. AYMORÉ ROQUE POTTES DE MELLO - Presidente - Habeas Corpus nº 70022339659, Comarca de Novo Hamburgo: "À UNANIMIDADE, EM CONFIRMAR A LIMINAR E EM CONCEDER A ORDEM DEFINITIVAMENTE, A FIM DE RECONHECER AO PACIENTE O DIREITO DE RESPONDER AO PROCESSO EM LIBERDADE, RECOLHENDO-SE OS MANDADOS DE PRISÃO".