sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Justiça cogita fechar presídio no Acre por violação de direitos humanos

Caros,
para tomarem conhecimento de uma outra realidade bem próxima a mim, aqui do lado de Rondônia, no Acre (sim, ele existe galera do Sul!).
Vejam que o que ocorre no Presídio Central de Porto Alegre (RS), bem como na Colônia Penal Agrícola do Mato Grosso do Sul, no Presídio Aníbal Bruno em Pernambuco, no Presídio Lemos de Brito em Salvador da Bahia, na Casa de Detenção Masculina da Sejuc em São Luís no Maranhão, e aqui no Presídio Urso Branco em Porto Velho.
Ou seja, é a mesma situação de sempre. Parece que não muda nunca. Falta vontade política, e principalmente social (que é o que mais me preocupa), em mudar (para melhor é óbvio) as condições cruéis e aberrantes (faltam palavras para experssar) dentro de nosso sistema penitenciário.
As equações carceirizantes são as mesmas em qualquer rincão desse país:
SER HUMANO + FATO (ainda que supostamente) DELITIVO = CRIMINOSO  
CRIMINOSO = PRESIDIÁRIO
PRESIDIÁRIO = LIXO
LIXO = RESTO
E RESTO TEM QUE SER DESCARTADO.

Prof. Matzenbacher


JUSTIÇA COGITA FECHAR PRESÍDIO NO ACRE POR VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS


A juíza Luana Campos, titular da Vara de Execuções Penais de Rio Branco, declarou nesta sexta-feira (27) ter ficado “chocada com a falta de respeito aos direitos humanos”, após inspecionar o Complexo Penitenciário do Acre.
A magistrada considera a possibilidade de pedir a interdição de duas unidades prisionais caso o governo estadual não adote providências no prazo de 20 dias. Com 2,8 mil detentos, o Acre é, proporcionalmente, o estado com a maior população carcerária do país.
Luana Campos esteve na Unidade de Recuperação Social Francisco D’Oliveira Conde (FOC), que possui o maior número de presos, e na Unidade de Regime Fechado 2 (antigo Antônio Amaro), que abriga os apenados que respondem por crimes mais graves, de clamor público ou envolvidos em organizações criminosas.
Ela constatou superlotação, falta de atendimento médico, falta de medicamentos, demora na realização do exame criminológico, proliferação de doenças, celas sem iluminação, ventilação, colchões, água e material para higiene.
A titular da Vara de Execuções Penais de Rio Branco criticou a atuação do Instituto de Administração Penitenciária do Acre (Iapen), do governo estadual: - Não estão sendo dadas pelos setores responsáveis as devidas condições de respeito e dignidade a essas pessoas.
No mês passado, o Ministério Público Federal no Acre chegou a enviar recomendação aos governos federal e estadual, além do Judiciário, para que tomem medidas visando garantir direitos humanos e melhoria das condições de vida dos presos no Estado.
A juíza considera que a Unidade Provisória, na FOC, apresenta a pior situação. Existem 796 presos provisórios, número mais de quatro vezes maior do que a capacidade máxima, que é 190 apenados.
- É um dormindo em cima do outro, sem o menor respeito aos direitos humanos - resumiu a juíza.
Em 2010, o Mutirão Carcerário, do Conselho Nacional de Justiça, esteve no Acre e exigiu uma série de providências para atenuar o quadro alarmante do sistema prisional do Estado.
- Apesar disso, nenhuma das providências deliberadas à época pelo CNJ foram cumpridas - observou a juíza.
Embora a Unidade Semi-Aberto não enfrente tantas dificuldades quanto à superlotação (possui capacidade para 148 presos e atualmente abriga 234), há outro impasse: a maior parte deles acaba cumprindo uma pena mais rigorosa do que a que foi imposta. Sem trabalho externo, ficam trancados dia e noite, e assim acabam cumprindo toda a pena em regime fechado.
A juíza vai editar uma portaria permitindo que esses detentos saiam pela manhã, mesmo sem o trabalho, e retornem para o pernoite. Nesse caso, serão concedidos 30 dias a todos que estão no regime semi-aberto, para que saiam durante o dia e procurem trabalho voluntariamente.
Durante esse período, serão impostas todas as condições formais, como recolhimento noturno, entre outros regramentos. Decorrido o prazo, caso não consigam emprego, terão que retornar à unidade prisional.
- Fico muito preocupada com toda essa problemática que encontrei nas unidades, porque detectei que o sistema não ressocializa os detentos e não reinsere esses indivíduos, seja na sociedade ou no mercado de trabalho. Isso faz com que eles provavelmente voltem a delinquir, já que não lhes estão sendo dadas as mínimas condições de estrutura, acolhimento, higiene e saúde - avaliou a juíza.
Uma unidade de castigo, conhecida como Chapão, no presídio estadual, possui capacidade para 320 presos, mas está com 1.178. Segundo a juíza, falta até água para tomar banho. A média varia de 10 a 15 pessoas por cela, com apenas seis baldes, de modo que alguém sempre fica sem banho.
Também falta acompanhamento médico, equipamento dentário, além de assistência social e jurídica. A falta de medicamentos é um dos maiores problemas. Alguns detentos que fazem uso de remédios controlados estão sem recebê-los há pelo menos um mês.
Segundo a juíza, uma reclamação que é repetida por quase todos os presos é quanto às atividades internas. Não há trabalho e estudo suficientes para todos. Isso é considerado fundamental até mesmo para remissão da pena.
Atualmente estão sendo desenvolvidas atividades somente de horta, faxina, cozinha e escola, mas são poucas as vagas para o montante de apenados. Já as demais atividades profissionais, como as de uma fábrica de bolas, estão paralisadas.
Providências
A Justiça anunciou que vai solicitar ao Iapen, em caráter de urgência, a transferência equitativa dos presos da Unidade de Regime Provisório. O objetivo é desafogar o complexo penitenciário.
O assunto será encaminhado à corregedoria do Tribunal de Justiça, para que adote providências junto aos juízes criminais, especialmente no sentido de agilizar a apreciação dos processos de presos provisórios.
Quanto ao regime fechado, para não prejudicar os apenados, a juíza vai adotar como sistemática a contagem de horas de serviço, mesmo que a unidade não ofereça atividades profissionais no âmbito do complexo penitenciário.
A juíza anunciou, ainda, que vai solicitar providências urgentes ao Iapen sobre as questões que envolvem atendimento médico, odontológico, higiene, medicamentos, reforma e manutenção dos pavilhões que apresentam situação insalubre.
Luana Campos já determinou que a autorização para trabalho externo de detentos seja deferida pela direção do Iapen e não mais pela Vara de Execuções Penais de Rio Branco.
Também foi repassado o controle do livramento condicional para o Conselho Penitenciário, como forma de desafogar o trabalho da Vara de Execuções Penais de Rio Branco, que poderá se dedicar prioritariamente à análise processual.

Fonte: Blog do Altino (em 27/01/2012)
http://blogdaamazonia.blog.terra.com.br/2012/01/27/justica-cogita-fechar-presidio-no-acre-por-violacao-de-direitos-humanos/

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

A França e a manutenção do paradigma etiológico

Caros,
como o foco da imprensa internacional está voltado para o "Costa Concórdia" e o foco da imprensa nacional para o "estupro no BBB", a notícia veiculada hoje no O Globo teve pouca repercussão. Contudo, para os curiosos das Ciências Criminais, o tema não pode passar batido. Em pleno século XXI, justamente no país do lema moderno intransponível da "liberdade, igualdade, fraternidade", o Ministro do Interior, em que pese a diminuição dos índices de criminalidade na França, imputa o aumento de assaltos aos imigrantes do leste europeu(!).
É, não adianta: a igualdade é para nós, e não para os outros. Se nem em um país como a França o paradigma etiológico foi superado, o que dizer do paradigma da reação social?
Prof. Matzenbacher

 
Ministro francês culpa imigrantes por aumento de assaltos

Claude Guéant atribui ações a grupos de criminosos ‘do leste e do centro da Europa’

PARIS - O ministro do Interior da França, Claude Guéant, demonstrou satisfação nesta terça-feira com a queda da criminalidade na França em 2011, mas culpou imigrantes europeus do leste e do centro do continente pelo aumento de 16% nos assaltos no país, ampliando o debate sobre a imigração apenas três meses antes da eleição presidencial.

Desde que foi nomeado ministro pelo presidente Nicolas Sarkozy, há um ano, Guéant desperta preocupações por suas duras posições de direita na questão da imigração. Guéant comemorou a redução de 12 mil crimes em 2011 ante 2010 na França, uma queda de 0,34%, bem como o nono ano seguido de redução da criminalidade no país. Mas ele observou que há uma crescente tendência de aumento de delitos por parte de pessoas do leste e centro da Europa. "É uma tendência dos últimos dois anos. Essas são ações de grupos de criminosos do exterior, especialmente do leste e do centro da Europa", disse Guéant em entrevista à imprensa.

O ministro afirmou que vai apoiar uma mudança na legislação para permitir a deportação de estrangeiros condenados por esses crimes. "É muito difícil combatê-los porque são pessoas que escapam de um país a outro muito rapidamente", disse ele à rádio RTL. Guéant supervisionou no começo de sua gestão a controvertida deportação de ciganos que estavam ilegalmente no país, e no ano passado deslanchou uma onda repressiva contra ladrões desse grupo étnico.

O governo de Sarkozy endureceu suas posições sobre imigração num momento em que tenta retomar o apoio de eleitores que passaram para o lado da Frente Nacional, de extrema direita. No início deste mês, Guéant divulgou com estardalhaço o número recorde de deportações de imigrantes ilegais em 2011. Ele impôs a meta de reduzir a imigração legal para a França para 150 mil pessoas por ano, depois de ter reduzido a quota de 200 mil para 180 mil nos últimos anos.

FONTE: O GLOBO (em 18/01/2012)
http://oglobo.globo.com/mundo/ministro-frances-culpa-imigrantes-por-aumento-de-assaltos-3694470

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Editorial - METEORO DA PAIXÃO (por Luiz Fux)

Caros,
inciamos 2012 com muita determinação e perseverança na incançável luta pela efetividade das garantias fundamentais daquele(s) que se senta(m) no banco dos réus. Seja nos tribunais, nas salas de audiência, nas delegacias, nas salas de aula, devemos sempre ter a mente aberta (livre de maniqueísmos) não se olvidando das lutas heróicas e históricas que asseguram, ainda que formalmente, um Estado Democrático de Direito em nosso país. Assim, com esse espírito, hoje já tivemos a oportunidade de nos indignar com a (falta de) fundamentação para afastar preliminares (inarredáveis) em um baita processo penal por aqui. Mas... o ano está apenas começando! E, após umas ótimas férias junto do Meu Amor por terras portenhas e uruguaias, sinto que esse ano promete! Então, ao passo que desejo um ÓTIMO 2012 para todos os que passam os olhos por aqui, trago um editorial do Min. Luiz Fux, publicado no O Globo de hoje, que vale a pena ler.
Seguimos na corrente CONTRAMAJORITÁRIA, ainda que em minoria!
Abraços,

Prof. Matzenbacher


Meteoro da paixão


LUIZ FUX

A opinião pública, elemento importante de legitimação democrática das decisões judiciais, vem se insurgindo com extrema justiça contra as mazelas do Poder Judiciário.
É mister, que reste claro para o povo, representado pelos poderes da República, que é do interesse da própria instituição a apuração das disfunções, surjam de onde surgirem.
Essa questão atual não se confunde com a técnica de julgamento da Suprema Corte.
O tema gravita em torno dos valores inerentes aos juízes conquanto seres humanos; vale dizer: a paixão e a razão.
Séculos atrás o universo jurídico viu-se invadido pela escola do direito livre, tendo como um de seus precursores Kantorwicz.
Carlos Maximiliano, o filósofo da hermenêutica, anotou na sua memorável obra com mais de 2 dezenas de edições que essa escola do pensamento jurídico deixava-se tomar pela paixão, desconsiderando a razão jurídica e as leis e, por isso, percorreu a Europa como um meteoro, trajeto rápido sem deixar vestígios, agradando, apenas, aos teóricos do anarquismo.
Jhering, por seu turno, advertia que o fim do direito era a paz, mas o meio de obtê-la era a luta.
O epílogo secular dessa luta consagrou o banimento da autodefesa individual e social e o monopólio da justiça como guardiã do direito posto, evitando, assim, a vitória do forte sobre o fraco, fazendo prevalecer o melhor direito.
Incumbido dessa tarefa pelos representantes do povo compete ao Poder Judiciário tornar realidade os direitos consagrados, além de para esse fim submeter-se à constituição e às leis.
É cediço que sem o respeito de todos pelo direito posto, não há ordem e não há paz social.
Essas elementares percepções denotam a necessidade de esclarecimentos ao povo sobre questões atuais sobre como deve atuar a Suprema Corte.
A questão central é saber: por que a Corte Suprema não pode decidir sempre conforme a opinião pública? Por que agem os juízes no espaço aparentemente reservado ao Legislativo?
A opinião pública é variável e apaixonada e, no âmbito jurídico, deve prevalecer a contenção do magistrado, tal como na visão lúdica enunciada por Calamandrei: o cidadão decide com a paixão ao passo que ao juiz incumbe fazer prevalecer a razão jurídica.
Historicamente, paixões passageiras serviram às barbáries, e os juízes que se encantaram com esse sentimento efêmero foram julgados em Nuremberg.
É evidente que sempre que possível a Suprema Corte deve legitimar-se democraticamente por meio de decisões que mereçam o apoio popular, como por exemplo ocorreu recentemente com o reconhecimento da união homoafetiva, com a liberdade de expressão da imprensa e do povo, este na marcha pela descriminalização do uso da maconha.
Entretanto, nem sempre é assim.
Um país que respeita a sua Constituição rígida não pode submetê-la às interpretações apaixonadas e momentâneas, sob pena de mutilá-la ao sabor do populismo judicial, que é mais pernicioso do que o populismo político.
O Supremo Tribunal Federal é guardião dos direitos fundamentais contemplados na Constituição, ainda que contra os avanços da maioria, por isso que nessa luta entre o Constitucionalismo de direito e o Constitucionalismo popular o tribunal deve ser necessariamente contramajoritário.
A voz racional do povo está na sacralidade da Constituição lavrada por um poder originário eleito pela sociedade e sob a inspiração de Deus; como enuncia a Carta Maior.
A voz apaixonada reside no dia a dia, a qual, pela sua própria instabilidade, recomenda reflexão.
O denominado ativismo judicial, vale dizer a atuação do Judiciário no espaço reservado ao Legislativo, decorre não só da omissão em legislar sobre determinado tema mas também da provocação do Judiciário para manifestar-se e, por força da mesma, tem o dever de fazê-lo.
Os juízes não podem agir sem que sejam solicitados. É princípio elementar de direito.
Quem quer que se dedique à história das Cortes Supremas há de verificar que há denominadas eras, como por exemplo, a “era Warren” da Suprema Corte Americana, na qual esta plasmava decisões nos espaços vazios de regulação dos direitos fundamentais, legados ao relento pelo Legislativo.
Os momentos denominados do ativismo judicial são marcados exatamente pela defesa das liberdades, entre as quais a liberdade de imprensa, a igualdade dos homens bem como outras garantias pétreas arrancadas entre lutas e barricadas contra o nazi-facismo.
Essas revisões da história conduzem-nos a concluir que mercê de devermos sempre estar atentos à higidez moral da instituição, o pretenso constitucionalismo popular corre o severo risco de encantar momentaneamente; passar pela história como um meteoro da paixão sem deixar vestígios, senão o único: o de criar a escola do “direito passional”, em nome do qual se morre e se mata, mesmo sem razão.

Fonte: O GLOBO (16/01/2012)