sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Quem disse que Direitos Humanos é Direito de Bandido?

Caros,
um tema recorrente e sem dúvida muito mal tratado pelo senso comum (tanto teórico quanto comum-comum mesmo), que por ignorância ou perversidade, enchem a boca para falar a frase título do artigo e do post. COmo bandeira política então, nem se fale. Ir para um palanque e defender Direitos Humanos para todos é como pedir para ser escrachado publicamente. Mas para descer a lenha nos Direitos Humanos dos seres humanos que praticaram um(ns) crime(s) é ser louvado como o grande salvador da pátria e realmente defensor da paz social e da democracia (qual?).
O artigo não é uma discussão filosófico-jurídica sobre Direitos Humanos, mas linhas simples e objetivas que mostram claramente a a visão de como esses Direitos são vistos por seres (questiono se são humanos). Serve principalmente ao senso comum, que é facilmente enganado e manipulado discursivamente, sobre o porquê devemos pensar sobre Direitos HUMANOS. Se bem que, senso comum, é comum mesmo, então, não posso esperar ue leiam o que está aqui postado.

RAPIDINHA:
 
Hoje dizem: - Ah os garantistas.
 
Quando precisarem, dirão: - Ah, os GARANTISTAS!

 
Prof. Matzenbacher

PS: para ver o vídeo citado no artigo acesse diretamente o link ao final, citado como fonte.


QUEM DISSE QUE DIREITOS HUMANOS É DIREITO DE BANDIDO?

A vereadora Elaine Matozinhos perdeu, na última segunda feira, dia 5 de novembro, uma excelente oportunidade de ficar calada. Ou talvez seja o inverso: devemos agradecer à parlamentar por mostrar, em um pronunciamento na Câmara Municipal de Belo Horizonte, sua postura autoritária, irrefletida e danosa acerca do importantíssimo tema dos Direitos Humanos. Ela, além disso, teceu considerações completamente descabidas sobre a Comissão da Verdade e os crimes perpetrados pelo Estado na Ditadura Militar, mas isso é assunto para outra coluna. Ver um parlamentar defendendo, ainda que de forma velada, a tortura policial e a ditadura em um discurso em um órgão público do Brasil redemocratizado não é, infelizmente, algo incomum, pois vivemos em uma democracia ainda recente.
Matozinhos, que se tornou delegada durante a ditadura militar, parece não haver abandonado o ranço truculento e antidemocrático que marcava as instituições políticas e policiais no período e que, infelizmente, deixou resíduos perceptíveis em muitas das práticas adotadas cotidianamente em nosso país. A vereadora, basicamente, fez uso da palavra, no exercício de suas funções para defender a postura “idiotizante”, compartilhada por parte do senso comum, de que os Direitos Humanos, atualmente, servem apenas para defender “bandidos” e “vagabundos” e para atacar as polícias.
 
Não existe mito no Brasil contemporâneo que não seja, ao mesmo tempo, tão disseminado e tão falso. Apresentadores de programas sensacionalistas, quando vão mostrar à população qualquer crime horrendo, sempre desfilam, depois de uma tacanha entrevista com o suspeito, o mesmo repetitivo discurso. O palavrório já deve ser conhecido de nossos leitores: trata-se de uma caricatura grotesca de argumentação, dita sempre aos berros e com o dedo indicador em riste, culpando os defensores dos Direitos Humanos por todas as mazelas que hoje assolam nosso país.
Pois, gostaríamos de deixar claro de uma vez por todas: quem defende os Direitos Humanos defende a integridade física e a vida das pessoas que se encontram sob a tutela prisional do estado sim, mas defende também, e de muitas maneiras diferentes, os direitos e o bem estar de todos os brasileiros.
Antes de continuar, é importante explicar de forma clara o que são os tais Direitos Humanos, que se tornaram o bode expiatório favorito de parte da nossa imprensa.
Os Direitos Humanos são nada mais do que o conjunto de normas e valores considerados essenciais e básicos para que todo e qualquer ser humano possa ter uma vida digna e livre. São normas criadas para garantir às pessoas algumas prerrogativas sem as quais a vida humana não pode ser nem inteiramente vida e nem inteiramente humana.  A liberdade de expressão, o direito à integridade física, a um julgamento justo, o direito de ir e vir, à alimentação, à saúde, à educação, à moradia, à expressão afetiva, à liberdade religiosa… todos esses são Direitos Humanos.
Outra característica importante dos Direitos Humanos é a sua universalidade. Trata-se de uma simples questão de lógica: se esses direitos se aplicassem apenas a uma parcela da população e não se aplicasse a outra, o Estado não estaria reconhecendo uma parcela de seus habitantes como gente, o que foi, exatamente, o que Hitler fez com os judeus, os ciganos e os homossexuais.
A universalidade dos Direitos Humanos tem implicações importantes: se você defender que essa gama de prerrogativas básicas não se aplica aos presos, sejam eles réus, condenados ou suspeitos, estará defendendo que, na eventualidade (que não é assim tão eventual) de a polícia brasileira cometer um erro e te meter no xilindró, você estará poderá se sujeitar à tortura, a tratamentos degradantes, a privação de comida e água e a todas as medidas absurdas e meramente vingativas que certas pessoas defendem para combater a criminalidade.
Em nosso país, os detentos são temporariamente privados de alguns direitos humanos, como, por exemplo, a liberdade de ir e vir e os direitos políticos, mas reparem que não são direitos cuja suspensão acarreta danos irreparáveis, como o direito à vida, à integridade física e à saúde.
Pode-se argumentar que o estado não garante saúde, educação, segurança e moradia dignas para boa parte da população. Por que deveria garantir esse direito aos presos?
Respondo: não é o fato de o Brasil estar errado em não oferecer condições dignas de vida para todos os seus súditos que estão livres, que vai tornar corretas as violações aos Direitos Humanos dentro dos estabelecimentos carcerários. Aliás, se existissem em nosso país políticas sérias e efetivas de implementação dos Direitos Humanos em todas as esferas da vida dos cidadãos, o problema da violência, que tanto parece preocupar as “Elaines Matozinhos” que existem por aí seria, certamente, muito menor.
Por falar em Elaine Matozinhos, fica aqui um recado para a vereadora: a liberdade de expressão, que garantiu à vereadora o direito de fazer uso da palavra em um órgão público para suas imprecações raivosas e o direto ao voto, que a colocou em seu atual cargo, são, ambos, Direitos Humanos.
A defesa dos Direitos Humanos é uma simples questão de raciocínio lógico e de humanidade e discursos como os da vereadora só servem para desviar o foco do verdadeiro problema: a pouca atenção que tem sido dada a esses direitos por nossos órgãos políticos. Contra isso sim, vale a pena discursar.
** Pedro Munhoz é advogado e historiador. Escreve no Bhaz às quartas-feiras.
 
FONTE: em 08/11/2012