sexta-feira, 16 de abril de 2010

CNJ e STF, motivos para orgulhar-se???


Caros,
hoje foi veiculada uma reportagem pelo STF e CNJ, em tom de "orgulho" pelo Mutirão Carcerário do CNJ que "permitiu a liberação de 20 mil presos em 1 ano e 7 meses". Sinceramente, fiquei boquiaberto com tal "conquista". Ora bolas! Vamos acordar para a realidade tchê! Não se trata de uma permissão, de um favor, mas de reconhecer o direito fundamental à liberdade em casos de clara violação desse direito máximo (o qual só pode ser restringido cumprido diversos requisitos e desde que respeitadas certas garantias fundamentais).
Imaginem o absurdo de reconhecer como "orgulho" o tratamento absurdo dado pelo sistema de justiça criminal brasileiro a esses 20 MIL (não são apenas 2 ou 20, mas 2o MIL mesmo) seres humanos.
Seres humanos que, ou foram condenados e cumpriram suas penas e ainda permaneceram presos, ou indiciados ou réus que estavam presos ilegalmente. Em nenhuma hipótese vislumbramos felicidade. Mas sim, tristeza e incredulidade. Ficamos realmente triste com isso.
Contudo, como falado, relatado e noticiado, classificação é de que isso é como se fosse uma permissão a essas pessoas??? Nossa (!), desculpem o desabafo, mas há algo muito errado na lógica do sistema. Isso já sabemos e criticamos justamente buscando um aperfeiçoar do sistema de justiça criminal. Mas a indignação e tão grande que o erro ganha uma amplitude semântica tão grande justamente pela simplicidade da palavra, ao expressar a incredulidade.
Isso não é um motivo de orgulho. Muito pelo contrário, é um motivo de indignação e lamentação. Aliás, 20 MIL motivos de indignações e lamentações. 20 MIL em 1 ano e 7 meses apenas.
Nossa Carta Magna (muitas e muitas vezes esquecida nas delegacias, nos fóruns, nos gabinetes, nas repartições públicas, e não apenas nesses espaços físicos, mas por aqueles que mais devem zelar por ela) determina e funda um sistema de garantias fundamentais os quais são irrenunciáveis e não são negociáveis. É o mínimo dos mínimos para se coadunar com o preceito fundamental do Estado Democrático de Direito brasileiro: a dignidade da pessoa humana (e aqui ela tem um conceito totalmente fechado não permitindo abertura).
Os direitos e garantias fundamentais devem ser preservados, respeitados e garantidos. Dissemos e repetimos: não se trata de permissão como se fosse uma baita concessão, um favor prestado pelo Poder Judiciário. Não. O Poder Judiciário deve cumprir sua missão no processo penal ao determinar (vejam que é uma ordem) a máxima (não a mínima ou nenhuma) efetividade às garantias de todos aqueles que se sentam no banco dos réus. Essa é a função instrumental do processo penal no caminho entre o delito e a pena. O processo penal é imprescindível, ou seja, ele é necessário para ligar o delito à pena. Todavia, não é qualquer processo que serve à Democracia. A tutela jurisdicional que se quer é uma tutela jurisdicional efetiva. E para isso, a jurisdição deve ser respeitada, a gestão da prova deve ser respeitada, a presunção de inocência deve ser respeitada, o contraditório e a ampla defesa devem ser respeitados, e a motivação das decisões judiciais deve ser respeitada. Não basta respeitá-las em apenas um ou dois processos. Mas deve ser respeitada em todos os processos por todos os magistrados e Magistrados. Aqui existe outra ordem: o dever, e não a faculdade.
Desculpem-me o CNJ e o STF, mas não consigo ver ninguém de "parabéns" por isso tudo. Por essas 20 MIL situações e por todas as outras que ainda permanecem no limbo como sabemos. Agora perguntamos: até quando vamos ficar "parabenizando" uma moral fajuta dessas, como se fosse um comportamento superior, em que aqueles que devem cumprir suas funções, simplesmente, não as cumprem??? Até quando vamos ficar "reconhecendo o valor"de alguém ou de alguma instituição por apenas cumprir o seu dever???
Sinceramente, gostamos das palavras proferidas ontem pelo próximo Presidente do Pretório Excelso, o Ministro Cezar Peluso, ao afirmar que "o que se faz com preso no Brasil é um crime do Estado contra o cidadão". Pois é, mas como no Brasil ninguém pode ser privado da sua liberdade sem uma autorização escrita e fundamentada emitida pela autoridade judiciária competente (salvo o flagrante delito, mas logo após a lavratura o magistrado deve se pronunciar sobre o "status libertatis" - o que é esquecido - ?), quem coloca o réu dentro do cárcere é o juiz. Então, até quando vamos ficar fugindo das nossas responsabilidades??? Até quando vamos ficar permitindo que as prisões provisórias sejam banalizadas??? Até quando vamos ficar permitindo as escutas telefônicas ilegais??? Até quando vamos ficar fechando os olhos para os problemas da Justiça Criminal brasileira??? (suspiro)
Esperamos que o Ministro Cezar Peluso não esqueça (nem como magistrado, nem como cidadão e nem como líder da Suprema Corte brasileira) que há muito trabalho a ser feito e muito pouco para se vangloriar (o Ministro Gilmar Mendes foi eleito o homem do ano - pasmem!). Pois as violações de direitos e garantias fundamentais de apenas uma pessoa afetam toda a coletividade. Afetam cada um de nós, e isso sim gera a descrença e a descredibilidade do Poder Judiciário, e não a não aplicação da "tolerância zero" como fazem alguns magistrados que vestem a toga de justiceiros da sociedade, olvidando (de propósito) direitos e garantias fundamentais de todos (o réu não é o inimigo).
Sinceramente, não consigo imaginar o mínimo de glória para o CNJ no caso desses 20 MIL seres humanos que estiveram presos ilegalmente. 20 MIL processos. Por quantos operadores do Direito esses 20 MIL processos passaram? Por quantos representantes do Ministério Público? Por quantos Juízes de Direito? Por quantos Advogados? Por quantos Tribunais? Ou o que é pior, não ter passado por absolutamente nada nem ninguém (relembrando o caso de MG do Sr. Marcos Mariano da Silva - preso por 13 anos sem inquérito e sem processo), estando provado o fracasso e a falência do sistema de Justiça Criminal brasileiro.
Se o ano de 2010 será o "Ano da Justiça Criminal", já começamos o ano tarde. Pois embora o reveillon já tenha passado, o carnaval passou, o coelinho da páscoa já deixou seus chocolates, o leão está aí, e continuamos de luto por essas 20 MIL pessoas que sofreram esses gravíssimos abusos cometidos diretamente pelo Estado. Aliás o ano ainda não começou, pois logo vem a copa do mundo, as férias de julho, o 7 de setembro, o 20 de setembro, as eleições e... OPS... o papai noel desce pela chaminé e com ele leva o "Ano da Justiça Criminal", pois as decisões que continuam saindo...

Tenham todos uma ótima sexta-feira à noite!! Porque agora, vamos comemorar com os amigos, porque hoje é sexta-feira e é Dia dos Amigos. Contudo, não ficaria tranquilo com tamanha barbaridade tchê, e sem antes, falar umas verdades.

Forte abraço,


Prof. Matzenbacher





Mutirão Carcerário do CNJ já permitiu a liberação de 20 mil presos em um ano e sete meses

O Mutirão Carcerário, criado em 2008 por iniciativa do presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, já permitiu, no período entre agosto daquele ano e abril de 2010, a expedição de alvarás de soltura de 20 mil presos que já haviam cumprido a pena a que foram condenados ou se encontravam privados de sua liberdade ilegalmente.

Este é um dos dados apresentados, nesta sexta-feira (16), no 12º Congresso das Nações Unidas sobre Prevenção ao Crime Justiça Criminal, que se realiza em Salvador (BA), pelo conselheiro do CNJ Walter Nunes e pelo juiz federal auxiliar do STF, Jairo Schäfer.

Segundo Jairo Schäfer, o Brasil, com 473 mil presos, tem uma das mais altas taxas carcerárias do mundo, superadas apenas por poucos países, entre os quais a Rússia e os Estados Unidos. Segundo ele, o mutirão carcerário já permitiu a análise de 112 mil processos desses presos e a concessão de 34.600 benefícios, incluindo alvarás de soltura ou progressão do regime de prisão para semiaberto (com possibilidade de trabalhar fora, retornando ao presídio à noite) ou aberto, com o preso podendo dormir em casa, mas se apresentando periodicamente à autoridade policial. Com isso, já se começou a aliviar os excessos da população carcerária.

Eles informaram, ainda, que o programa “Começar der Novo”, também criado por iniciativa do atual presidente do CNJ e STF com objetivo de permitir a reinserção de ex-presos na sociedade, oferecendo-lhes emprego, já permitiu colocar em postos de trabalho 2.000 presos e que a expectativa é aumentar esse número para 7.000, até o fim deste ano.

Informaram, ainda, que o CNJ declarou o ano de 2010 “Ano da Justiça Criminal”, significando a importância que decidiu atribuir ao tema. Amanhã, o ministro Gilmar Mendes participará dos debates de alto nível do Congresso, em que se negocia a redação da “Declaração de Salvador”, o documento final a ser divulgado segunda-feira, por ocasião do encerramento do evento.

Mutirões

O conselheiro do CNJ Walter Nunes informou que os mutirões carcerários foram consequência de inspeções públicas realizadas por iniciativa do conselho e que “revelaram uma inconsistência muito grande no funcionamento da Justiça criminal”. Então, para sanar ou minorar os problemas encontrados, o CNJ criou um grupo de trabalho incumbido de elaborar um plano estratégico específico para as varas criminais.

A partir da constatação de que, no complexo sistema judiciário brasileiro, composto por tribunais, todos eles com autonomia, não havia um compartilhamento de experiências, nem mesmo a definição da estratégia para enfrentar o problema, que na verdade é global, concluiu-se que, para obter melhores resultados, a Justiça como um todo precisa atuar com maior sintonia.

Segundo Nunes, constatou-se, também, que um grande problema da execução penal é a falta de controle da população carcerária. Havia – e ainda continua havendo – presos já com direito a benefício que não deveriam mais estar na prisão. Por outro lado, o sistema de regime aberto de cumprimento de pena é inadequado. Isto porque, além de o formato atual não servir para ressocializar o preso, as pessoas sob este regime não são controladas ou monitoradas quando em liberdade.

Diante disso, o CNJ propôs ao Congresso Nacional a introdução do monitoramento eletrônico dos presos, já em vigor em alguns países, mas ainda em debate no Brasil. Nesta quinta-feira, o ministro do STF Cezar Peluso, que também participou do Congresso e preside grupo latino-americano que elaborou proposta de uma convenção internacional destinada a tornar obrigatória a obediência de regras mínimas no tratamento de presos, ponderou que a questão precisa ser bem analisada, levando em consideração os direitos humanos do preso.

Processo eletrônico

Na próxima segunda-feira, será inaugurado, em Natal, o sistema de processo eletrônico elaborado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), com sede em Recife. Segundo o conselheiro do CCJ Walter Nunes, o modelo do TRF-4 é melhor até agora desenvolvido e será implantado em todo o país.

Com a generalização do processo eletrônico, a Justiça ganhará mais celeridade, o que possibilitará acelerar, também, a revisão dos processos dos detentos. Ele funcionará 24 horas por dia, todos os dias da semana. Isto significa que qualquer advogado que quiser acessar um processo poderá acessá-lo a qualquer hora, e um juiz, mesmo se encontrando fora do país, poderá dar despachos em processos a ele afetos.

Walter Nunes observou que “o grande o problema da prestação da atividade jurisdicional em país de dimensões como o Brasil reside na questão da comunicação”. Ele exemplificou essa dificuldade, no modelo tradicional, por exemplo para ouvir uma pessoa na Amazônia ou no Nordeste, se o processo está tramitando no Sul.

Lembrou que vários juízes já adotam, por exemplo, a videoconferência, sem necessidade de deslocamento do preso para o local da audiência. Por outro lado, a saída do modelo tradicional para o eletrônico dá maior consistência, principalmente em recurso, quando o processo vai para instâncias superiores, pois permite o contato direto com a prova da forma como ela foi produzida.

Nunes apontou, também, as transformações que o novo sistema permitirá na comunicação em regime de plantão, quando ocorre a prisão de alguém em flagrante. Segundo ele, a ação própria da autoridade policial é momento extremamente crítico. É quando a pessoa está no cárcere, sem que tenha havido uma determinação judicial. Portanto, requer rapidez.

No modelo tradicional, a polícia manda um calhamaço de papel para o Judiciário. No regime de plantão, seja qual for a hora, o juiz encaminha o processo para o Ministério Público (MP), e depois ocorre toda a triangulação de retorno da forma de tramitação desses documentos. Na forma eletrônica que começa a ser utilizada por alguns juízes, tudo isso se faz por essa via: na hora em que a autoridade policial encaminha o processo para o juiz, ela já a encaminha para o MP. Isso abrevia, em muito, o tempo de apreciação final dos processos.

Nunes lembrou que, no CNJ, todos os processos são eletrônicos.

Fonte: STF (em 16 de abril de 2010)