sexta-feira, 25 de maio de 2012

UNIRON - Acórdão I

Caros Alunos da Turma D34,
segue Acórdão do TJRS que trabalhamos em sala sobre os Embargos de Nulidade, com verdadeiros efeitos Infringentes.
Abraços,

Prof. Alexandre



Embargos infringentes. violação de direito autoral. auto de apreensão descumprimento das formalidades legais. ausência de comprovação da materialidade.
1. A redação do artigo 530-C do Código de Processo Penal exige o cumprimento de formalidades legais, as quais não foram observadas no caso em apreço. A formalidade também é uma garantia do processo Assim, o descumprimento de uma forma processual, na qual implique restrição ao direito de defesa, gera vício processual.
2. No caso em apreço, apesar de uma amostra do material ter sido submetida à perícia, não houve o cumprimento mínimo das disposições do artigo supracitado, ou seja, o auto não foi assinado por duas testemunhas, mas sim pelos profissionais provavelmente lotados na delegacia de polícia; não houve descrição de nenhum dos CDs ou DVDs apreendidos, mas apenas a indicação numérica dos bens apreendidos e, por fim, não houve indicação da origem. Ausência de comprovação da materialidade do fato.

EMBARGOS ACOLHIDOS.


Embargos Infringentes e de Nulidade

Segundo Grupo Criminal
Nº 70047508999

Comarca de Vacaria
LUCIMARA APARECIDA ABREU

EMBARGANTE
MINISTERIO PUBLICO

EMBARGADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes do Segundo Grupo Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em acolher os embargos infringentes.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Gaspar Marques Batista (Presidente), Des. Marco Antônio Ribeiro de Oliveira, Des. Ivan Leomar Bruxel e Des. Francesco Conti.
Porto Alegre, 11 de maio de 2012.


DES. NEREU JOSÉ GIACOMOLLI,
Relator.


RELATÓRIO
Des. Nereu José Giacomolli (RELATOR)
Trata-se de EMBARGOS INFRINGENTES opostos por LUCIMARA APARECIDA ABREU, em razão de acórdão proferido nos autos da apelação nº 70043930361, da Relatoria do Des. Gaspar Marques Batista, julgado na sessão do dia 15 de dezembro de 2001 que, por maioria, negou provimento ao apelo, vencido o Relator que o provia para absolver a ré Lucimara Aparecida Abreu da imputação do artigo 184, § 2º, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, II, do Código de Processo Penal.
Em razões, a defesa sustentou a prevalência do voto vencido, por seus próprios e jurídicos fundamentos, alegando que tanto o Ministério Público quanto a polícia civil não poderiam alegar desconhecimento do artigo 530-C do Código de Processo Penal, norma que expressamente dispõe a respeito das formalidades a serem observadas quando forem apreendidas as mercadorias, isto é, a lavratura do termo por duas testemunhas, bem como a descrição de todos os bens apreendidos. Sem isso, não restaria comprovada a materialidade do delito. Postulou o acolhimento dos embargos (fls. 165 a 167).
O parecer da representante da Procuradoria de Justiça foi pela rejeição dos embargos (fls. 172 a 176).
É o relatório.

VOTOS
Des. Nereu José Giacomolli (RELATOR)
Eminentes colegas:
O objeto da divergência cinge-se à nulidade absoluta do auto de apreensão por não ter cumprido as formalidades legais.
O voto vencido, de lavra do Des. Gaspar Marques Batista, foi proferido nos seguintes termos:

DES. GASPAR MARQUES BATISTA - O recurso merece guarida. Não foram observados os preceitos do art. 530-C do CPP, específicos para a lavratura do auto de apreensão, quando se tratar de crime contra a propriedade intelectual. Do auto de apreensão de fl.15, não constam as assinaturas de duas testemunhas, tampouco os bens apreendidos foram descritos como expressamente previsto no art. 530-C, restando violado o dispositivo legal mencionado. Portanto, não há nos autos prova material do fato denunciado, sendo impositiva a absolvição da ré, com fundamento no art. 386, inciso II, do CPP.
Mesmo a existência de exame pericial, fls. 52/78, não supre o vício existente no auto de apreensão/arrecadação. A perícia e o auto de apreensão provam coisas diferentes. Com a perícia ficou provado que o material examinado era pirata, com o auto de apreensão, deveria ficar provado que o material pirata foi apreendido em poder da ré. Resultado: há um material pirata, cuja origem é desconhecida. Como essa disposição do art. 530-C foi editada na mesma oportunidade – mesma lei - em que foi criado o tipo penal, é de entender-se que era vontade do legislador proteger pessoas inocentes de possível arbitrariedade policial. Havendo forma prescrita em lei para o ato - aqui esta forma é específica para o caso - desobedecida a forma, ocorre nulidade absoluta do auto de apreensão. Sem auto de apreensão, falta prova material. Conclusão: há um material pirata, o que se ficou sabendo através da perícia, mas não se sabe onde estava quando foi apreendido, porque inexistente auto de apreensão válido, forma imprescindível na investigação dessa modalidade criminosa.
A garantia LIV do art. 5º da Constituição diz que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens, sem o devido processo legal.
É conveniente ressaltar que este sempre foi o entendimento deste relator, no entanto em homenagem à jurisprudência do 2º Grupo Criminal vinha decidindo de modo diverso. Tendo em vista a nova composição do 2º Grupo Criminal, retomo o entendimento de que, se inobservadas as determinações do art. 530-C, do CPP, quanto ao auto de apreensão/arrecadação, não está comprovada a materialidade.
Por tais fundamentos, voto pelo provimento do recurso da defesa, para absolver a ré Lucimara Aparecida Abreu, da imputação do art. 184, § 2º, do CP, com fundamento no art. 386, inciso II, do CPP.

Estou em acolher os embargos de divergência.
Em primeiro lugar, imprescindível referir que as formas, segundo BINDER, são a garantia para o processo (BINDER, Alberto M. O descumprimento das formas processuais. Elementos para uma crítica da teoria unitária das nulidades no processo penal, 2003, pp. 42-43).
Assim, o descumprimento de uma forma processual, na qual implique restrição ao direito de defesa, gera nulidade. No caso em apreço, o auto de apreensão da fl. 15 não cumpriu minimamente o disposto na legislação processual penal. Não houve sequer informação/ especificação das mercadorias apreendidas, como adiante se verá.
Nessa senda, como refere FAZZALARI através de sua teoria do processo como procedimento em contraditório, o contraditório foi elevado à categoria de máxima garantia dentro do processo, consubstanciada não somente na informação, sempre necessária, como também na possibilidade de reação, que poderá ser eventual. Em suma, há necessidade da igualdade simétrica de oportunidades, bem como da igualdade de “dizer e contradizer”:
A exteriorização do princípio do contraditório, na proposta de FAZZALARI, se dá em dois momentos. Primeiro com a informazione, consistente no dever de informação para que possam ser exercidas as posições jurídicas em face das normas processuais e, num segundo momento, a reazione, manifestada pela possibilidade de movimento processual, sem que se constitua, todavia, em obrigação. Logo, no caso do Processo Penal, o contraditório precisa guardar igualdade de oportunidades, exigindo assim, a revisão de diversas regras do Código de Processo Penal brasileiro, mormente no tocante à gestão da prova e ao (dito) objeto do processo, deixando-se evidenciada qual a conduta a ser verificada, via denúncia/queixa apta, os meios para a configuração e as posições processuais de cada envolvido, no que a epistemologia garantista (FERRAJOLI) se associa (MORAES DA ROSA, Alexandre. “O processo (penal) como procedimento em contraditório: Diálogo com Élio Fazzalari”. In: Revista Novos Estudos Jurídicos, 2006, p. 222 a 223).

A essência do contraditório, que é a igualdade simétrica de oportunidade dos participantes que sofrerão os efeitos do ato final, do provimento, a igualdade de oportunidade de ‘dizer e contradizer’, não se confunde com o seu objeto, que se constitui das questões que se suscitam sobre os atos processuais” (GONÇALVES PLINIO, Aroldo.

A redação do artigo 530-C do Código de Processo Penal exige o cumprimento de formalidades legais, as quais não foram observadas no caso em apreço. Destaco a redação do artigo:

Art. 530-C. Na ocasião da apreensão será lavrado termo, assinado por 2 (duas) ou mais testemunhas, com a descrição de todos os bens apreendidos e informações sobre suas origens, o qual deverá integrar o inquérito policial ou o processo. (Incluído pela Lei nº 10.695, de 1º.7.2003)

Analisando o auto de apreensão da fl. 15, apenas constou que o material teria sido apreendido em poder de Lucimara Aparecida Abreu e, ao final, as assinaturas da autoridade, do escrivão e do apreensor. Na relação de objetos apreendidos constou:
- (...)
- 239 CDS de músicas e cantores diversos;
- 313 DVDs de filmes diversos.

Como se pode observar, apesar de uma amostra do material ter sido submetida à perícia (fls. 52 a 77), não houve minimamente o cumprimento das disposições do artigo supracitado, ou seja, o auto não foi assinado por duas testemunhas, mas sim pelos profissionais provavelmente lotados na delegacia de polícia; não houve descrição de nenhum dos CDs ou DVDs apreendidos, mas apenas a indicação numérica dos bens apreendidos e, por fim, não houve indicação da origem.
Entendo, nos termos do voto vencido, não ter havido comprovação da materialidade do delito, razão pela qual acolho os embargos de divergência.
É o voto.

Des. Francesco Conti (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).
Des. Gaspar Marques Batista (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a).
Des. Marco Antônio Ribeiro de Oliveira - De acordo com o(a) Relator(a).
Des. Ivan Leomar Bruxel - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. GASPAR MARQUES BATISTA - Presidente - Embargos Infringentes e de Nulidade nº 70047508999, Comarca de Vacaria: "À UNANIMIDADE, ACOLHERAM OS EMBARGOS INFRINGENTES.”

Julgador(a) de 1º Grau: ANELISE BOEIRA V MARIANO DA ROCHA