quinta-feira, 4 de março de 2010

STF - Prisão preventiva deve ser PREVENTIVA!!!


Caros,
segue mais uma decisão do STF, lançada no HC 98.239, de relatoria do Ministro Celso de Mello, em 03/03/2010. Trata-se de um caso em que o reu esta preso preventivamente ha mais de 04 anos, pela suposta pratica de latrocinio e homicidio duplamente qualificado, sendo que, sequer se chegou a fase dos arts. 413 a 419, do CPP.
Razoes da prisao peventiva: periculosidade do agente e gravidade das condutas. Contudo, questiona-se: a "gravidade" e a " periculosidade" constam no art. 312, do CPP??? Constam em algum diploma legal??? Sera que alteraram o CPP a essa versao atualizada foi encaminhada somente para "alguns sabios"???
E claro que houve violacao total da dignidade humana, da presuncao de inocencia e da razoavel duracao do processo penal. A regra e a liberdade e a prisao e excecao!!! Caracterizadissimo o constrangimento ilegal, mesmo tratando-se de delitos hediondos. O verdadeiro Julgador deve ensejar efetividade as garantias daquele que se senta no banco dos reus.
O que impressiona e a manifestacao de Tribunais entendendo que 04 anos e razoavel, pois a demora nao foi provocada pelo MP ou pelo Poder Judiciario, mas sim, baseada nos inumeros requerimentos da defesa! Como se a ampla defesa nao pudesse ser realmente ampla! Surreal...
Ainda bem que o desprezo estatal pelo status libertatis do cidadao (ora reu no processo penal) foi encerrado com a decisado do decano do Pretorio Excelso.
Abracos e boa leitura,

Prof. Matzenbacher



HC 98239 MC / PE - PERNAMBUCO
MEDIDA CAUTELAR NO HABEAS CORPUS
Relator(a): Min. CELSO DE MELLO
Julgamento: 18/09/2009

Publicação

DJe-183 DIVULG 28/09/2009 PUBLIC 29/09/2009

Partes

PACTE.(S): JOVENTINO CÂNDIDO RAMOS NETO

IMPTE.(S): JOSÉ FRANCISCO ARRUDA ALVES DE VASCONCELOS

COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Decisão

PRISÃO CAUTELAR. DURAÇÃO IRRAZOÁVEL QUE SE PROLONGA, SEM CAUSA LEGÍTIMA, HÁ QUASE QUATRO (04) ANOS. PROCEDIMENTO PENAL, INSTAURADO PERANTE A VARA DO JÚRI, QUE SEQUER ATINGIU A FASE A QUE SE REFEREM OS ARTS. 413 A 419 DO CPP, NA REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 11.689/2008. CONFIGURAÇÃO, NA ESPÉCIE, DE OFENSA EVIDENTE AO “STATUS LIBERTATIS” DO PACIENTE. INADMISSIBILIDADE. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MEDIDA LIMINAR DEFERIDA.

Trata-se de “habeas corpus”, com pedido de medida liminar, impetrado contra decisão emanada da Quinta Turma do E. Superior Tribunal de Justiça, consubstanciada em acórdão assim ementado:

“‘HABEAS CORPUS’. PROCESSUAL PENAL. LATROCÍNIO E HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO. LIBERDADE PROVISÓRIA. INDEFERIMENTO FUNDAMENTADO NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. GRAVIDADE CONCRETA DEMONSTRADA PELO ‘MODUS OPERANDI’. PERICULOSIDADE DO PACIENTE. EXCESSO

DE PRAZO IMPUTADO À DEFESA INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO DA SÚMULA N.º 64 DESTA CORTE. PRECEDENTES.

1. A custódia cautelar está suficientemente justificada à luz dos dados fáticos e jurídicos presentes na ação penal, diante da gravidade concreta da conduta imputada ao Paciente, que demonstra a necessidade de proteção da ordem pública, em face da evidente periculosidade do acusado.

2. A instrução criminal foi conduzida sem qualquer irregularidade, restando plenamente justificado o excesso de prazo, pois não provocado pelo Juízo ou pelo Ministério Público, mas em razão de diversos requerimentos formulados pela Defesa, que impediram seu encerramento na data aprazada. Incidência da Súmula n.º 64, do Superior Tribunal de Justiça.

3. Ordem denegada.”

(HC 78.423/PE, Rel. Min. LAURITA VAZ – grifei)

O ora impetrante informa que o paciente está preso, cautelarmente, há quase quatro (04) anos, não havendo sido sequer sentenciada a causa penal contra ele instaurada (Processo-crime nº 243.2006.000075-8).

O exame dos elementos trazidos aos autos, considerada a seqüência cronológica dos dados juridicamente relevantes, permite reconhecer a efetiva ocorrência, na espécie, de superação irrazoável dos prazos processuais, pois o ora paciente – consoante informa a parte impetrante – está preso, sem julgamento, há quase quatro (04) anos, datando, essa prisão, de 08/01/2006 (fls. 194/197).

Em conseqüência de tal situação (que é abusiva e inaceitável), o ora paciente permanece, na prisão, sem julgamento de seu processo, por período superior àquele que a jurisprudência dos Tribunais tolera, dando ensejo, assim, à situação de injusto constrangimento a que alude o ordenamento positivo (CPP, art. 648, II).

É sempre importante relembrar, neste ponto, que ninguém pode permanecer preso - especialmente quando sequer proferida sentença penal condenatória (RTJ 187/933-934, Rel. Min. CELSO DE MELLO – RTJ 198/1113-1114, Rel. Min. GILMAR MENDES – RTJ 201/663, Rel. p/ o acórdão Min. CEZAR PELUSO – HC 87.721/PE, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA - HC 89.202/BA, Rel. Min. MARCO AURÉLIO – HC 99.672/SP, Rel. Min. CEZAR PELUSO, v.g.) - por lapso temporal que supere, de modo excessivo, os padrões de razoabilidade acolhidos pela jurisprudência que o Supremo Tribunal Federal firmou na matéria ora em exame:

“O EXCESSO DE PRAZO, MESMO TRATANDO-SE DE DELITO HEDIONDO (OU A ESTE EQUIPARADO), NÃO PODE SER TOLERADO, IMPONDO-SE, AO PODER JUDICIÁRIO, EM OBSÉQUIO AOS PRINCÍPIOS CONSAGRADOS NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, O IMEDIATO RELAXAMENTO DA PRISÃO CAUTELAR DO INDICIADO OU DO RÉU.

- Nada pode justificar a permanência de uma pessoa na prisão, sem culpa formada, quando configurado excesso irrazoável no tempo de sua segregação cautelar (RTJ 137/287 – RTJ 157/633 – RTJ 180/262-264 – RTJ 187/933-934), considerada a excepcionalidade de que se reveste, em nosso sistema jurídico, a prisão meramente processual do indiciado ou do réu, mesmo que se trate de crime hediondo ou de delito a este equiparado.

- O excesso de prazo, quando exclusivamente imputável ao aparelho judiciário - não derivando, portanto, de qualquer fato procrastinatório causalmente atribuível ao réu - traduz situação anômala que compromete a efetividade do processo, pois, além de tornar evidente o desprezo estatal pela liberdade do cidadão, frustra um direito básico que assiste a qualquer pessoa: o direito à resolução do litígio, sem dilações indevidas (CF, art. 5º, LXXVIII) e com todas as garantias reconhecidas pelo ordenamento constitucional, inclusive a de não sofrer o arbítrio da coerção estatal representado pela privação cautelar da liberdade por tempo irrazoável ou superior àquele estabelecido em lei.

- A duração prolongada, abusiva e irrazoável da prisão cautelar de alguém ofende, de modo frontal, o postulado da dignidade da pessoa humana, que representa - considerada a centralidade desse princípio essencial (CF, art. 1º, III) - significativo vetor interpretativo, verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo o ordenamento constitucional vigente em nosso País e que traduz, de modo expressivo, um dos fundamentos em que se assenta, entre nós, a ordem republicana e democrática consagrada pelo sistema de direito constitucional positivo. Constituição Federal (Art. 5º, incisos LIV e LXXVIII). EC 45/2004. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Art. 7º, ns. 5 e 6). Doutrina. Jurisprudência.

- O indiciado ou o réu, quando configurado excesso irrazoável na duração de sua prisão cautelar, não podem permanecer expostos a tal situação de evidente abusividade, ainda que se cuide de pessoas acusadas da suposta prática de crime hediondo (Súmula 697/STF), sob pena de o instrumento processual da tutela cautelar penal transmudar-se, mediante subversão dos fins que o legitimam, em inaceitável (e inconstitucional) meio de antecipação executória da própria sanção penal. Precedentes.”

(RTJ 195/212-213, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno)

O excesso de prazo, portanto, tratando-se, ou não, de crime hediondo, deve ser repelido pelo Poder Judiciário, pois é intolerável admitir que persista, no tempo, sem razão legítima, a duração da prisão cautelar do réu, em cujo benefício – é sempre importante relembrar - milita a presunção constitucional, ainda que “juris tantum”, de inocência.

Daí a razão de a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal não admitir – porque absolutamente inaceitável - a subsistência de situações, como a que se registra nestes autos, que se mostram gravosas e ofensivas ao “status libertatis” de qualquer acusado (como sucede com o ora paciente, cautelarmente preso há quase quatro anos (!!!), sem julgamento definitivo de seu processo), bastando referir, nesse sentido, inúmeras decisões emanadas desta Corte Suprema (RTJ 118/484, Rel. Min. CARLOS MADEIRA – RTJ

187/933-934, Rel. Min. CELSO DE MELLO - RTJ 193/1050, Rel. Min. EROS GRAU – HC 79.789/AM, Rel. Min. ILMAR GALVÃO – HC 83.867/PB, Rel. Min. MARCO AURÉLIO – HC 84.181/RJ, Rel. Min. MARCO AURÉLIO – HC 84.907/SP, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, v.g.).

Cabe assinalar, finalmente, que o Supremo Tribunal Federal - revelando extrema sensibilidade a propósito de situações anômalas derivadas da superação abusiva e irrazoável do prazo de duração de prisões meramente cautelares - tem conhecido do pedido de “habeas corpus”, até mesmo quando não examinada essa específica questão pelo Tribunal de jurisdição inferior, como resulta claro das decisões a seguir mencionadas:

“RECURSO EM ‘HABEAS CORPUS’. LIBERDADE PROVISÓRIA. EXCESSO DE PRAZO. CONHECIMENTO DE OFÍCIO DA MATÉRIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. EXTENSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA.

O Tribunal tem admitido conhecer da questão do excesso de prazo quando esta se mostra gritante, mesmo que o tribunal recorrido não a tenha examinado.

.......................................................

Recurso provido em parte. ‘Habeas corpus’ concedido de ofício.”

(RHC 83.177/PI, Rel. Min. NELSON JOBIM - grifei)

“- ‘Habeas corpus’. Excesso de prazo para o encerramento da instrução criminal.

- ‘Habeas corpus’ de que não se conhece, por não ser caso de pedido originário a esta Corte, mas que se concede, ‘ex officio’, por gritante excesso de prazo.”

(HC 59.629/PA, Rel. Min. MOREIRA ALVES - grifei)

Sendo assim, e em face das razões expostas, defiro o pedido de medida liminar, em ordem a determinar a imediata soltura do ora paciente, se por al não estiver preso, relativamente ao Processo nº 243.2006.000075-8, em tramitação perante o Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal/Privativa do Júri da comarca de Vitória de Santo Antão/PE.

Comunique-se, com urgência, transmitindo-se cópia da presente decisão ao MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Criminal/Privativa do Júri da comarca de Vitória de Santo Antão/PE (Processo nº 243.2006.000075-8), ao E. Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco (HC nº 169.464-0) e ao E. Superior Tribunal de Justiça (HC 78.423/PE).

Publique-se.

Brasília, 18 de setembro de 2009.

Ministro CELSO DE MELLO

Relator