sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Aniversário da CF/88


HOJE A CONSTITUIÇÃO FEZ 24 ANOS DE IDADE E CONTINUA CONSTITUINDO POUCO: JUIZ SOFRE ESPANCAMENTO MIDIÁTICO

Em geral tenho evitado me manifestar em situações assim, mas realmente não posso deixar de comentar o absurdo espancamento midiático que o juiz Mauro Caum Gonçalves está sofrendo por parte da mídia gaúcha- em pleno aniversário da CF/1988 - por ser "apenas um juiz..." É a velha cultura inquisitória que não compreende o papel do juiz no marco constitucional-democrático.

Em apertadíssima sintese, após a realização de uma prisão em flagrante por crime de roubo (onde resultou ferida uma médica, portanto, um crime grave e isso não se nega), foi elaborado o respectivo auto de prisão em flagrante e encaminhado para o Juiz. Ora, desde sempre se sabe que o flagrante é pré-cautelar e não prende por sí só. Essa situação foi muito bem disciplinada pela lei 12.403 e a nova redação do art. 310. O juiz recebeu o APF e diante da ausência de pedido de prisão preventiva por parte do MP ou representação da autoridade policial, concedeu liberdade provisória mediante determinadas condições. O ponto da discórdia foi o seguinte (em sintese): poderia (ou deveria) o juiz converter a prisão em flagrante em prisão preventiva sem pedido do MP (de ofício)? ELEMENTAR QUE NÃO.

Há que se observar o seguinte: a tal conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva equivale, fática e juridicamente, ao ‘decretar de ofício’ a prisão preventiva. Ou seja, o resultado final da conversão é equivalente ao decretar a prisão preventiva de ofício. E, neste caso, além de clara violação das regras básicas do sistema acusatório-acusatório (vinculado à imparcialidade, por óbvio), viola-se frontalmente a regra insculpida no art. 311, que somente autoriza a prisão preventiva decretada de ofício na fase processual (um erro, registre-se), nunca na fase pré-processual. Dessarte, não precisa maior esforço para compreender que diante de uma prisão em flagrante, se houver requerimento do Ministério Público ou representação da autoridade policial, poderá o juiz, após análise da estrita necessidade, converter a prisão em flagrante em preventiva. Contudo, se não houver prévio pedido, não poderá o juiz converter o flagrante em preventiva, pois vedada está a decretação da prisão preventiva de ofício.

Portanto, para além do disposto no art. 311, há que se compreender o papel do juiz criminal no marco da CF/1988, à luz do sistema acusatório-constitucional, como verdadeiro garantidor das regras do jogo e não um justiceiro que prenda de ofício, produza prova de ofício, etc. Vivemos tempos dificeis, em que com certeza é muito mais fácil ter uma postura punitivista do que fazer valer as regras do devido processo. Felizmente existem juízes (independentes) no Brasil...

por AURY LOPES JR. via Facebook