terça-feira, 8 de setembro de 2009

TJ/RS - Acórdão (Perito, Policial, Nulidade Absoluta)


Caros,
a decisão é da 5a. Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Pensem: como um policial civil fará o laudo pericial sobre a potencialidade ofensiva de uma arma de fogo? Quais são os requisitos para alguém ser nomeado perito?
Boa leitura!


Prof. Matzenbacher


Processual penal. posse ilegal de arma. materialidade. nulidade da perícia. potencialidade ofensiva não comprovada. Absolvição.

1. A prova da materialidade do delito de posse ilegal de arma depende da realização de perícia comprobatória do seu potencial lesivo – aquilo que difere a arma de qualquer outro objeto comum.

2. Policial não pode atuar como perito, pois sua função – dar sustentação à versão apurada na fase investigatória – afasta, de antemão, a isenção necessária à atuação como experto.

À unanimidade, deram provimento ao apelo.

Apelação Crime

Quinta Câmara Criminal

Nº 70016415465

Comarca de Cacequi

MARCO AURéLIO FLORES DOS SANTOS

APELANTE E

MINISTÉRIO PÚBLICO

APELADO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento ao apelo defensivo para absolver o apelante com base no artigo 386, II, do Código de Processo Penal.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Aramis Nassif (Presidente) e Desa. Genacéia da Silva Alberton.

Porto Alegre, 11 de outubro de 2006.

DES. AMILTON BUENO DE CARVALHO,

Relator.

RELATÓRIO

Des. Amilton Bueno de Carvalho (RELATOR)

Na Comarca de Cacequi, o Ministério Público denunciou MARCO AURÉLIO FLORES DOS SANTOS como incurso nas sanções do art. 12, da Lei nº 10.826/03, c/c o art. 61, I, do Código Penal.

Narra a exordial acusatória a prática do seguinte fato:

“No dia 05 de janeiro de 2005, por volta das 09h15min, em uma lavoura de melancias, localizada nas margens do Rio Ibicuí, neste Município, o denunciado detinha e possuía, em seu local de trabalho, uma espingarda, calibre 32, marca Rossi, com numeração ilegível, municiada com um cartucho (auto de apreensão à fl. 04 do inquérito policial), em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

A arma era potencialmente lesiva, conforme demonstra o auto de exame pericial de fl. 12 do inquérito policial.

O acusado é reincidente, conforme certidão de fl.”

Após regular instrução – recebimento da denúncia (08/09/2005), citação, interrogatório (fls. 34/35), defesa prévia (fl. 39), coleta de prova oral (fls. 44/46), requisições de diligências e alegações finais –, sobreveio sentença (fls. 63/67) condenando o réu como incurso nas sanções do art. 12, da Lei 10.826/03, c/c o art. 61, I, do Código Penal. A pena-base foi fixada em 01 ano e 04 meses de detenção; em razão da reincidência, a pena foi exasperada em 03 meses; presente a atenuante da confissão, a pena foi reduzida em 02 meses, restando definitiva em 01 ano e 05 meses de detenção, a ser cumprida em regime inicial aberto, mais pecuniária de 15 dias-multa, no valor unitário mínimo legal.

Inconformada com a decisão do juízo a quo, a defesa apelou, requerendo o provimento do apelo para absolver o réu, já que inexiste nos autos prova da potencialidade ofensiva da arma apreendida – a arma era municiada apenas com espoleta, no intuito de afastar animais das plantações do réu.

Contra-arrazoado o apelo, vieram os autos a esta Corte.

Nesta instância, a Procuradoria de Justiça, pelo Dr. Edgar Luiz de Magalhães Tweedie, opina pelo provimento do apelo para o fim de absolver o acusado, com o reconhecimento da atipicidade da sua conduta.

É o relatório.

VOTOS

Des. Amilton Bueno de Carvalho (RELATOR)

Com a respeitável vênia do ilustre colega Ricardo Falleiro Carpilovsky, estou a optar pelo resultado absolutório.

Explico.

O apelante foi condenado pelo crime de posse ilegal de arma.

A Câmara pacificou entendimento: à prova da materialidade, em crimes de posse ilegal de arma, necessária é perícia que demonstre a potencialidade ofensiva.

Também pacificou a seguinte diretiva: policiais civis não podem ser peritos – falta a isenção ao exercício da tarefa.

No caso concreto, a perícia celebrada à constatação da potencialidade ofensiva da arma é nula. Como se vê da portaria de nomeação acostada às fls. 15/16, pelo menos um dos peritos – Richard Soares dos Santos – é policial civil, tanto que atuou no inquérito (ver fls. 07 e 08), o que repele, de antemão, a isenção necessária para a atuação como experto.

Nesse sentido esta Câmara já decidiu:

Direito Penal e Processual Penal. Porte ilegal de arma e receptação.

– À configuração do crime de porte ilegal de arma necessária é perícia comprobatória da potencialidade ofensiva.

– Policiais civis não podem ser peritos: sua atividade abala a isenção necessária à atuação.

– Porte ilegal e receptação do mesmo bem não podem conviver isoladamente: portar é receber, logo há absorção deste por aquele.

– A recepção dolosa exige prova séria da ciência da origem criminosa da coisa. Se a natureza da coisa faz presumir a má origem, dá-se receptação culposa.

– Deram parcial provimento ao apelo defensivo (unânime)”. (Apelação Crime n° 70008212847, 5ª Câmara Criminal, TJRS, Rel. Des. Amilton Bueno de Carvalho, j. em 28.04.2004).

Pois bem.

Sendo nula a perícia, falece também a prova da materialidade do delito de posse ilegal de arma, pelo que se afigura imperativa a absolvição do réu.

Diante do exposto, dá-se provimento ao apelo defensivo para absolver o apelante com base no artigo 386, II, do Código de Processo Penal.

Desa. Genacéia da Silva Alberton (REVISORA) - De acordo.

Des. Aramis Nassif (PRESIDENTE) - De acordo.

DES. ARAMIS NASSIF - Presidente - Apelação Crime nº 70016415465, Comarca de Cacequi: "À UNANIMIDADE, DERAM PROVIMENTO AO APELO DEFENSIVO PARA ABSOLVER O APELANTE COM BASE NO ARTIGO 386, II, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL."

Julgador(a) de 1º Grau: RICARDO FALLEIRO CARPILOVSKY