Roubo majorado. Condenação: mantida ante a solidez probatória. Atenuante: pode deixar a pena aquém do mínimo (o artigo 65, Código Penal, fala em sempre, e sempre é sempre, pena de sempre não o ser. Majorante do uso de arma: excluída por inexistência de prova da potencialidade ofensiva do aparato. Recolhimento prisional: o condenado somente será recolhido a estabelecimento prisional que atenda rigorosamente aos requisitos impostos pela legalidade – Lei de Execução Penal. Legalidade: não se admite, no Estado Democrático de Direito, o cumprimento da lei apenas no momento em que prejudique o cidadão, sonegando-a quando lhe beneficie. Missão judicial: fazer cumprir, apesar de algum ranger de dentes, os direitos da pessoa – seja quem for, seja qual o crime cometido.
À unanimidade, deram parcial provimento ao apelo para reduzir a pena do acusado. Por maioria, determinaram que o apenado cumpra pena em domicílio enquanto não houver estabelecimento que atenda aos requisitos da LEP, vencido o Relator, que determinava a suspensão da expedição do mandado de prisão enquanto não houver estabelecimento que atenda a tais requisitos.
Apelação Crime | Quinta Câmara Criminal |
Nº | Comarca de Porto Alegre |
RAFAEL SANTOS DE JESUS | APELANTE E |
MINISTéRIO PúBLICO | APELADO. |
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento ao apelo defensivo para reduzir a pena do apelante para quatro anos e três meses de reclusão, multa mínima, em regime carcerário semi-aberto; e, por maioria, em determinar que, enquanto não existir estabelecimento destinado ao regime semi-aberto que atenda a todos os requisitos da LEP, o réu cumprirá sua pena em regime domiciliar, vencido o Relator, que definia que somente será expedido mandado de prisão se e quando houver estabelecimento carcerário que atenda a ditos requisitos da LEP. O juízo da execução fixará as condições da prisão domiciliar.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Aramis Nassif (Presidente e Revisor) e Des. Luís Gonzaga da Silva Moura.
Porto Alegre,
DES. AMILTON BUENO DE CARVALHO,
Relator.
RELATÓRIO
Des. Amilton Bueno de Carvalho (RELATOR)
Na Comarca de Porto Alegre, o Ministério Público denunciou Rafael Santos de Jesus como incurso nas sanções do artigo 157, §2º, I e II, do Código Penal.
Narra a inicial acusatória a prática do seguinte fato:
No dia
Por ocasião dos fatos, o denunciado estava jantando na residência das vítimas, juntamente com estas. Ao perceber que não havia refrigerante, uma das vítimas pediu para que o denunciado fosse buscar, o que foi atendido. O denunciado retornou à residência acompanhado de outro elemento e, empunhando revólveres, não apreendidos, anunciaram o assalto, passando a arrecadar os objetos acima descritos. Ato contínuo, o denunciado e seu comparsa empreenderam fuga.
Diante disso, a vítima registrou ocorrência na delegacia.
A res furtivae não foi recuperada.
Após a instrução – recebimento da denúncia (em
A pena-base foi fixada em 04 anos de reclusão. Pelo reconhecimento da majorante anunciada, foi aumentada em 2/5 e assim tornada definitiva, ante a inexistência de causas modificadoras. Total: 05 anos, 07 meses e 06 dias de reclusão, em regime semi-aberto, mais pecuniária de 20 dias-multa, à razão mínima.
Inconformada, a Defensoria Pública recorreu. Preliminarmente, suscitou a nulidade do processo em função da ausência de renovação do interrogatório ao final do rito, ante o advento da reforma processual penal (Lei 11.719/08). No mérito, pugnou pela absolvição ante a insuficiência probatória. Alternativamente, requereu a desclassificação do delito de roubo para furto, o afastamento das qualificadoras, o redimensionamento das penas e o afastamento da pena de multa.
Contra-arrazoado o apelo, vieram os autos a esta Corte.
Nesta instância, a Procuradoria de Justiça, pelo Dr. José Pedro M. Keunecke, opina pelo improvimento do apelo.
É o relatório.
VOTOS
Des. Amilton Bueno de Carvalho (RELATOR)
Vênia da colega singular, dou parcial provimento ao apelo defensivo. Contudo, a reforma atinge o periférico: dosimetria da pena. A preliminar de nulidade suscitada vai rejeitada.
Explico.
A reforma instituída pela Lei 11.719/08 entrou em vigor quando o acusado já havia sido interrogado e a instrução ainda não tinha sido concluída. Ocorre que, ao final da oitiva das testemunhas (já sob o novo rito processual), nada foi requerido pelas partes (fl. 74) e a instrução foi declarada encerrada. Além disso, não foi aquele interrogatório considerado nulo – já que realizado no rito antigo, revestido da formalidade daquele tempo; regular, portanto.
Mesmo considerando o interrogatório realizado ao final da instrução como ato mais benéfico ao acusado, não cabe, a esse momento, declarar-se a sua nulidade se, quando praticado, vício algum o atingia. Ainda mais quando ao final da instrução, nada nesse sentido fora postulado – a defesa não requereu novo interrogatório. Assim, não se pode dizer que a oportunidade, não requerida, foi obstaculizada pelo juízo a quo. Tudo porque, oportunizada a fala última às partes, o silêncio delas findou por manifestar a anuência com o encerramento da instrução naquelas condições.
Pois bem.
A materialidade e a autoria do delito vieram consubstanciadas pelo boletim de ocorrência, pelo auto de avaliação indireta (fl. 20), pela confissão do réu e pelo restante da prova oral colhida.
Segundo as vítimas, o acusado, acompanhado de um terceiro não ouvido nesses autos, teria, mediante ameaça exercida pelo emprego de arma de fogo, subtraído a res descrita na inicial. O discurso de ambas é uníssono em atribuir ao acusado Rafael a autoria do delito. Segundo afirmaram, no dia do fato, o acusado se encontrava na casa delas e, ao sair para comprar um refrigerante, retornou acompanhado do terceiro, aí praticando o assalto.
O réu, por seu turno, em juízo, admitiu que na companhia desse terceiro subtraiu – sem qualquer violência ou ameaça - um aparelho de DVD das vítimas. Em sua versão, ele e tal sujeito não identificado foram à casa das vítimas para cobrar o pagamento de uma dívida – de origem sexual, não comprovada. Diante da negativa dos ofendidos em efetuar o pagamento de R$ 80,00, eles, os réus, na “mão grande” teriam pego o aparelho de DVD (fl. 49).
Da narrativa judicial feita por todos (réu e vítimas), emerge a prova de que tudo se deu em concurso de agentes. A dissonância se dá em relação à motivação do agir.
Assim posta a fática, opta-se pela fala das vítimas que tem valor especial em crimes da espécie, máxime quando, como aqui, não demonstrado interesse espúrio na incriminação.
Então, cuida-se, sim, de roubo em parceira – um apontava a arma enquanto outro desapossava as vítimas de seus bens.
Bem condenado, pois.
Ao exame da reprimenda.
Pena-base no mínimo – tal qual na sentença, não recorrida pelo MP.
Presentes a menoridade e a confissão espontânea, a redução é de 09 meses: 03 pela confissão parcial e 06 meses pela menoridade – ciente de que as atenuantes podem deixar a pena aquém do mínimo. A redação do artigo 65 contempla a expressão “sempre”. E sempre é sempre, sob pena de sempre não o ser. Ante o reconhecimento do concurso de agentes, o aumento é de 1/3 – afasto a majorante do emprego da arma de fogo porque não apreendida e não periciada. Nesse sentido, a Câmara já se pronunciou:
PERÍCIA. NECESSIDADE. 2. PROVA. PALAVRA DA VÍTIMA. 3. RECEPTAÇÃO. TRANSPORTE E AQUISIÇÃO. VÍNCULO.
“roubo majorado. materialidade e autoria comprovadas. afastamento da causa especial do aumento do emprego de arma. perícia não realizada. incerteza quanto à potencialidade lesiva. grave ameaça, no entanto, mesmo ASSIM, configurada. incidência da majorante do concurso de agentes. agravante da reincidência desconsiderada. pena redimensionada.
Apelação parcialmente provida.”(Apelação Crime
Final: 04 anos e 03 meses de reclusão, em regime semi-aberto, mais pecuniária de 10 dias-multa, à razão mínima – impossível ser afastada porque pena é.
Do cumprimento da pena de prisão.
O pacto constitucional assim está posto: cidadão que comete delito de roubo majorado responde pena em presídio (no caso concreto, o acusado, se viu, restou condenado a pena de quatro anos e três meses de reclusão, em regime carcerário semi-aberto) – a pena ora concretizada entre os limites postos pela legalidade.
É a primeira face do sistema – a sanção sofrida por agressão à lei penal. Aqui está a dor a ser infligida a ele.
A segunda face do cumprimento da pena imposta está no limite que o Estado impõe a ele mesmo, para que a arbitrariedade não se faça presente. Ou seja, a lei – limite ao poder desmesurado – que determina as condições que devem imperar no cumprimento da sanção corporal.
Aqui o Estado inibe, no viés constitucional, como direito e garantia fundamental, penas cruéis (art. 5, XLVII, “e”); “a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado” (XLVIII); “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral” (XLIX); “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano e degradante” (III).
Na suma, a Lei Maior estabelece – diferente não poderia ser neste estágio civilizatório – o princípio da humanidade das penas!
Ao aterrissar o comando constitucional, a Lei de Execução Penal define explicitamente, nos artigos
Assim, vê-se, com obviedade, que o Estado deve punir aquele que agride a lei penal e, numa outra ponta, deve cumprir rigorosamente com as normas estabelecidas para o cumprimento das penas que ele impõe.
Ou seja, a legalidade tem dois vieses: um que determina a prisão (contra o cidadão) e outro que protege o apenado.
Tanto é assim que a própria LEP estabelece o incidente do “excesso ou desvio” da execução para as situações em que “algum ato for praticado além dos limites fixados na sentença, em normas legais ou regulamentares” (art. 185).
Todavia, tem acontecido – máxime no Estado Gaúcho – verdadeira autofagia sistêmica: com base na lei se condenam pessoas a pena de prisão (para prejudicar) mas no momento em que se deve beneficiá-las (condições prisionais), nega-se a legalidade. Algo intolerável, beirando a hipocrisia.
Todos, absolutamente todos, sabemos que o Estado é violador dos direitos da população carcerária. Todos, absolutamente todos, sabemos das condições prisionais. E mesmo assim confirmamos o sofrimento gótico que alcança os apenados.
Nos últimos tempos tudo é desvelado pela imprensa: juiz da execução penal, às lágrimas, denuncia que tem vergonha de ser gaúcho, ante o que acontece nos presídios; tentativa de responsabilização de juízes e promotores pelas condições prisionais; os presídios gaúchos estão como os piores da nação – o pior entre os piores do mundo!
A dor é tão antiga, tão denunciada, tão presenciada, tão acomodada, tão escamoteada, que é de pasmar que nunca tenha sido superada – e tudo aponta no sentido de que nunca será. E aqui a Câmara faz “mea culpa” por ter sido conivente com o sistema prisional.
É momento (tardio, talvez) de dar um basta. Ou seja, de se cumprir integralmente a legalidade (não apenas naquilo que prejudica o cidadão). Não se trata de se pregar anomia, mas sim de cumprir com a lei.
Há, repito, contradição insuportável em se condenar alguém com base na lei e, depois, negá-la no momento da execução da pena!
Aliás, Ferrajolli já denunciou que a história dos presídios é mais degradante que a história dos crimes!
Não se pode, jamais, tratar pessoa alguma (seja quem for, seja qual o delito cometido) como meio (coisa), mas como fim (pessoa), em atenção ao imperativo kantiano.
Assim, leciona Nilo Batista, “a racionalidade da pena implica tenha ela um sentido compatível com o humano e suas cambiantes aspirações. A pena não pode, pois, exaurir-se num rito de expiação e opróbrio, não pode ser uma coerção puramente negativa” (..) “Contudo, a pena que se detém na simples retributividade, e portanto converte seu modo em seu fim, em nada se distingue da vingança” (BATISTA, Nilo. Introdução Crítica ao Direito Penal. Rio de Janeiro: Ed. Revan, 2005, p. 100).
Zaffaroni, ao invocar o princípio da humanidade, assevera que cabe ao julgador, diante as particularidades do caso concreto – o réu que sofre de grave enfermidade ou está próximo da morte; o que sofreu um acidente ou uma violência carcerária grave –, reconhecer a crueldade da pena e adequá-la de modo a atender aos ditames do referido princípio. Continua o autor, afirmando que “o princípio da humanidade das penas tem vigência absoluta e que não deve ser violado nos casos concretos, isto é, que deve reger tanto a ação legislativa – o geral – como a ação judicial – particular –, o que indicaria que o juiz deve ter o cuidado de não violá-lo” (ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direto Penal Brasileiro: Parte Geral. São Paulo: RT, 2004, p. 172).
Luigi Ferrajoli, também, afirma que a desumanidade das penas vai de encontro ao “princípio do respeito à pessoa humana” – da dignidade da pessoa –, no sentido de que “cada hombre, y por conseguiente también el condenado, no debe ser tratado nunca como un ‘medio’ o ‘cosa’, sino siempre como ‘fin’ o ‘persona’”, isto é, “o valor de la persona humana impone una limitación fundamental a la calidad y a la cantidad de la pena.” (FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón. Madrid: Editorial Trotta, 2001, p. 395). De tal modo, a legitimidade do Estado se funda “unicamente en las funciones de tutela de la vida y los restantes derechos fundamentales; de suerte que, conforme a ello, un estado que mata, que tortura, que humilla e un ciudadano no sólo pierde cualquier legitimidad, sino que contradice su razón de ser, poniéndose al nível de los mismos delincuentes.” (Ferrajoli, p. 396). É dever do Estado, portanto, assegurar que as condições de vida no presídio “sean para todos lo más humanas posible y lo menos aflictivas que se pueda” (p. 397).
Alguns poderão alegar que o Estado não tem condições econômicas de executar as penas de acordo com a lei: primeiro, não é verdade – há, sim, possibilidade financeira, apenas é questão de prioridade; e, segundo, se não se cumpre a lei que favorece, que não se cumpra a que desfavorece!
Outros colocarão em debate o rançoso confronto: direitos da sociedade e direitos dos condenados. No entanto, não estão jamais em conflito: só se preservam os direitos do todo se se preservarem os direitos do um – todo é composto da soma de todos os “um” (ver Luc Ferry, “Aprender a Viver, Filosofia para os Novos Tempos”, Objetiva, p. 156.).
E a sociedade responde sim pelas decisões dos administradores que elege: opta pelas prioridades deles!
Neste contexto, tenho que o juiz é também responsável pela vida prisional, ou seja, pelo cumprimento das penas de acordo com a lei. É responsabilidade ética e legal: ele presenta o Estado que condena e presenta o Estado que encarcera. Duas faces indissociáveis: não se pode atuar ao modo de Pilatos. Enfim, deve atuar para que toda a legalidade (e não apenas parte dela) seja cumprida eficazmente.
Aliás, Rui Barbosa ensinava: “Não há salvação para o juiz covarde” (“O Justo e a Justiça Política”).
Então, qual o caminho a seguir?
De logo, saliento que a Suprema Corte aponta para solução inovadora ao permitir que condenados em regime aberto, em locais onde casa do albergado não cumpre condições de higiene suficientes e estão superlotadas, sem separação de condenados em regime semi-aberto (legalidade que se impõe), cumpram pena em regime domiciliar (HC 95332/RS, de
Por outro lado, se vê da Folha On Line, de
Que se cumpra a lei, é o caminho que se segue.
Assim, o ora condenado somente irá a presídio se e quando for preservada a vida prisional de acordo com a lei. Enquanto isso não for providenciado, o mandado de prisão ficará suspenso e correndo a prescrição.
Como a condenação presente, se viu, será cumprida em regime inicial semi-aberto, a determinação ora explicitada ao colega a quem cumprir a execução da pena é a seguinte:
(a) o condenado somente será recolhido
(b) poderá ser alojado em compartimento coletivo, com rigoroso cumprimento dos requisitos da letra “a”, do parágrafo único do artigo 88 da LEP (“salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana”), com (1) seleção adequada dos presos e (2) e obediência rigorosa do limite máximo da capacidade prisional, nos termos do art. 85 e seu parágrafo da LEP.
Inexistindo casas prisionais que atendam a todos os requisitos acima, se disse, o mandado de prisão será suspenso até que a burocracia estatal tudo supere. Em outras palavras, mesmo correndo o risco de ser repetitivo: em estando o réu preso em estabelecimento incompatível/inadequado, deverá ser imediatamente posto em liberdade.
Em síntese, o que se determina é que a Lei seja cumprida!
Diante do exposto, dá-se parcial provimento ao apelo defensivo para reduzir a pena do apelante para quatro anos e três meses de reclusão, multa mínima, em regime carcerário semi-aberto. Define-se explicitamente: o mandado de prisão somente será expedido se e quando houver estabelecimento carcerário que atenda aos requisitos da LEP, como se determinou no corpo do acórdão.
Des. Luís Gonzaga da Silva Moura (VOGAL)
Impossível não aderir aos argumentos do Relator, no que diz com a situação penitenciária. Há muito próxima do caos e sem atitudes concretas e eficazes do Estado (lato senso) visando corrigi-la. A triste realidade, hoje, é que, em se tratando de casas prisionais, ressalvadas algumas poucas exceções, não se cumpre, minimamente, o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III, da Constituição Federal).
Seguir ignorando tal situação e atirar um jovem, com as condições pessoais do ora acusado, ou seja, menor de 21 anos e primário, em um dos atuais “depósitos de presos” - com superlotação, condições subumanas e dividido por facções criminosas -, é privá-lo não só da liberdade (pena a que foi condenado a cumprir), mas também da dignidade e da esperança, já que nula a possibilidade de ressocialização.
Algo deve ser feito a evitar este excesso. E o que propõe o Des. Amilton Bueno de Carvalho a impedi-lo? Só e unicamente, cumprir a lei. Parece-me razoável.
Assim, o apelante, condenado a cumprir pena em regime semiaberto, só poderá ser recolhido
Contudo, enquanto inexistir estabelecimento destinado ao semiaberto que atenda a todos os requisitos da LEP, ouso propor solução diversa. Ao invés da suspensão do cumprimento do mandado de prisão, “até que a burocracia estatal tudo supere”, na linha do que decidem os Tribunais Superiores em situações análogas, cumprirá o apelante a pena imposta em “regime” de prisão domiciliar (art. 117 da LEP), cabendo ao Juiz da Execução Criminal estabelecer suas condições.
Em todo o mais, sigo o Relator.
É o voto.
Des. Aramis Nassif (PRESIDENTE E REVISOR)
Estou honrado em acompanhar o voto do eminente Relator, com pequena restrição, e o faço com a preocupação da oportunidade que se tem de superar uma omissão que era extremamente constrangedora: sonegar direitos ao cidadão, seja ele quem for.
Na verdade, muito se ouve em torno do ‘garantismo’ que, para alguns, em seu descuido intelectual, é execrado. E daí perguntar-me: é possível ser juiz sem ser garantista? Então, o que somos? Para que servimos? O juiz não só é e tem que ser garantista, como ele mesmo é ‘a’ garantia. Ninguém mais o é no Estado Democrático de Direito. E se ele não for, quem será? O Ministério Público, com sua nobre destinação constitucional? Obviamente que não, porque, assim como ele na condição de representante da sociedade, sempre é parte no processo e sua natural vocação é a acusatória. A defesa? Por óbvio que não. Sua destinação constitucional, que tantas vezes exige inomináveis sacrifícios, é a da representação do indivíduo, assegurado amplamente na Carta para que nós juízes, com a presença desses dois segmentos construtores da nação solidária e justa, que contrariamos em inúmeras oportunidades com nossas decisões, possamos fazer o que nos é destinado: julgar (com justiça).
Então, percebo neste voto exatamente isto: a coragem de ser juiz, a coragem de garantir direitos, a coragem de não se limitar a ser um mero justiceiro abrigado ao som de um discurso falacioso que reverbera em expressões como proteção, violência, criminalidade, impunidade, etc., para varrer para baixo do tapete a severa e grave omissão do Estado em proteger o indivíduo e a sociedade, recuperar os que tiveram uma conduta desviante e humanizar o sistema carcerário.
Enfim, nada mais se quer que o cumprimento da lei.
Todavia, examino o voto do eminente Desembargador Gonzaga Moura que oferece a alternativa de que “enquanto inexistir estabelecimento destinado ao semiaberto que atenda a todos os requisitos da LEP, ouso propor solução diversa. Ao invés da suspensão do cumprimento do mandado de prisão, “até que a burocracia estatal tudo supere”, na linha do que decidem os Tribunais Superiores em situações análogas, cumprirá o apelante a pena imposta em “regime” de prisão domiciliar (art. 117 da LEP), cabendo ao Juiz da Execução Criminal estabelecer suas condições”, ao qual estou por agregar por convencer-me de que é a solução mais adequada à espécie.
Acompanho o Relator em seu voto, mas com a alternativa oferecida pelo voto do eminente Desembargador Gonzaga Moura.
DES. ARAMIS NASSIF - Presidente - Apelação Crime nº
Julgador(a) de 1º Grau: HONORIO GONCALVES DA SILVA NETO